Entrevista: jornalista fala sobre a pesquisa Atlas da Notícia



O Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo (Projor) e a agência Volt Data Lab divulgaram recentemente o resultado da pesquisa Atlas da Notícia. O trabalho é fruto de um levantamento inédito sobre a existência ou ausência de veículos de imprensa em todo o Brasil. Foram identificados 5.354 sites e meios impressos em 1.125 cidades das 27 unidades federativas.

Esse universo engloba, aproximadamente, 130 milhões de pessoas, o que significa mais de 60% da população brasileira. Uma das principais observações foi a de que não houve registro desses canais de comunicação em 4.500 municípios, onde vivem 70 milhões de habitantes. Essa carência motivou a utilização do conceito "deserto de notícias".

Para explicar melhor sobre o Atlas da Notícia, o blog Dissertação Sobre Divulgação Científica entrevistou o jornalista Sérgio Spagnuolo, editor da Volt Data Lab, que conduziu as atividades da pesquisa. Confira!



Qual foi a grande descoberta que a pesquisa Atlas da Notícia proporcionou?

Com essa pesquisa, conseguimos enxergar no mapa brasileiro onde estão certos gargalos de notícia, onde se localizam regiões cuja cobertura de notícias locais é mínima ou inexistente. Foi possível perceber onde está a imprensa e onde há carência desse meio de comunicação social.

Por que a pesquisa Atlas da Notícia pode ser considerada o "ponto de partida do mapa do jornalismo brasileiro no século XXI"?
Não sei se chamaria de "ponto de partida". Acho que o Atlas da Notícia é um projeto importante para tomarmos conhecimento sobre a situação do jornalismo local no Brasil, estudarmos essa questão, levantarmos novas informações e eventualmente tentarmos solucionar certos problemas sociais.

O que motivou a realização da pesquisa?
O Atlas da Notícia é inspirado no projeto America’s Growing News Desert, da revista estadunidense Columbia Journalism Review.  Lá, houve um mapeamento da presença de jornais nos Estados Unidos diante das mudanças no modelo jornalístico de negócios responsáveis pelo fechamento de diversos veículos.

Qual a relação entre cidadania, democracia e jornalismo?
A democracia precisa do jornalismo, e o jornalismo de verdade depende da democracia. Cidadania é as pessoas exercerem os seus direitos e cumprirem os com seus deveres dentro do sistema democrático. Ser bem informado está cada vez mais ligado a esses deveres.

Como o jornalismo e a pluralidade de veículos podem contribuir para o amadurecimento social e cultural das populações?
Quando se possui poucas fontes de informação, ou mesmo uma única fonte, não há espaço para o contraditório, para o outro lado, para outras visões de mundo. Não há estímulo para a produção de qualidade, porque falta concorrência. A sociedade como um todo, especialmente as pequenas comunidades, perdem com a ausência de veículos de jornalismo. Para isso, os resultados da pesquisa Atlas da Notícia pode contribuir muito, tanto em relação a diagnósticos quanto de soluções.

Você concorda que a existência de alguns meios de comunicação jornalísticos em uma mesma região não significa, necessariamente, pluralidade de vozes e de interesses representados?
Depende de uma série de questões, como sobre a propriedade dos meios jornalísticos, como eles são financiados, o mandato que eles se propõe a ter... Em São Paulo, onde mapeamos cerca de 600 veículos, há informações sobre tudo: veículos de esquerda, direita, feministas, do movimento negro, etc. Já em cidades com baixa concentração de veículos por habitante, isso não acontece.

Há explicações para a carência de veículos jornalísticos em determinadas regiões?
Há sim, mas prefiro não especular muito sobre isso. São questões que vão desde o interesse econômico à carência de profissionais e oferta de salários adequados.

O que poderia ser feito para haver mais equilíbrio de oferta de informações e de atividades jornalísticas no país?
Prefiro não responder essa questão, nesse momento.

Muitos veículos se classificam como jornalísticos, mas não praticam a ética e os princípios da profissão. Como essa informação foi interpretada pela pesquisa?
Não foi interpretada. O que lançamos agora foi uma análise quantitativa. Futuramente, queremos abordar isso. Agora, só demos um passo inicial.

Que modelo de jornalismo seria mais adequado adotar para ser exercido em regiões distantes dos grandes centros urbanos, onde há carência de infraestrutura de comunicação e transporte, por exemplo?
O rádio ainda é um canal de comunicação fundamental para a informação chegar em regiões distantes dos grandes centros do desenvolvimento nacional. Mas, falar sobre modelos de negócios é algo mais complexo. Isso depende de muitos fatores.

Quais foram os métodos adotados na pesquisa?
Nós simplesmente fizemos um grande levantamento e contamos a existência de veículos. Todo o detalhamento pode ser encontrado em duas plataformas: Github (clique aqui) e Observatório da Imprensa (clique aqui).

Quais são os próximos passos da pesquisa?
Todas as informações levantadas estão abertas para outras pessoas trabalharem em cima delas também. Agora nós vamos em buscar parcerias institucionais e avançar com mais pesquisas e levantamentos.




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