Artigo: O Papa é pop, mas também antipop

Caros leitores, 


reproduzo abaixo o artigo O Papa é pop, mas também antipop, que publiquei na edição de 1°de agosto do jornal Tribuna de Petrópolis (baixe o texto):



Ele pôs os pingos nos i's. A visita do Papa Francisco ao Brasil foi decisiva para soprar as nuvens que dificultavam o entendimento e a definição de muitos aspectos da vida cristã, católica e mesmo social. Os conflitos internos, a falta de posicionamento público e o próprio distanciamento da Igreja vinham permitindo a circulação de ideias e teorias embaraçosas, até mesmo afastadas da realidade.

A reafirmação, com palavras, gestos e ações, do conceito de simplicidade foi, provavelmente, o fator-chave das pregações do pontífice, referindo-se diretamente ao modelo-padrão de sucesso que alimenta o status e os relacionamentos superficiais e provisórios. Etimologicamente, a palavra humildade vem do latim humus e reporta ao que vem da terra, ou seja, à raiz, ao original, à transparência (aliás, de humus surge o conceito de humano). Significa, então, estar despido de adereços que prejudicam o acesso à realidade, que atrapalham o conhecimento do ser em sua “intimidade”. E esse foi um dos motivos fundamentais responsáveis pela acalorada recepção do povo brasileiro ao papa, desprovido de vaidades e orgulhos. 

Sem dúvida, é um novo fôlego do qual precisavam o país e os católicos. É uma renovação de fé em um mundo (amplo, local e pessoal) que dá indícios de saturação de suas estruturas flexíveis e líquidas ao redor do business, o que pode ser observado pelo considerável aumento das vendas dos livros de autoajuda e encontro espiritual, por exemplo. Almeja-se um mais não necessariamente material! A humanidade retorna a um estágio “adolescente”, no sentido de questionar as bases, reformular identidades e buscar novas formações, mas formações sólidas, duradouras, com novas referências. 

O planejamento é de longo prazo. Observa-se aí que a pós-modernidade precisa de características modernas que consolidem essências e estabeleçam regras e valores. E esses valores precisam incorporar, em vez de segmentar e “excluir os extremos”, como os idosos e até os jovens (despreparados e sem oportunidades). Ir à “periferia” significa compreender, acolher e reconhecer o outro em sua legitimidade e dignidade. São relacionamentos vivos entre pessoas, e não a frieza de interações entre cargos e posições. 

Sem receio do confronto de argumentos e ideias, assim como do debate, Francisco se aproximou do povo e tocou em questões delicadas para a Igreja, como a corrupção, o sacerdócio feminino e a reforma da Cúria. Atos assim contribuem para combater aos poucos (ou aos muitos) intolerâncias, preconceitos, impurezas e desvios de conduta em graus e momentos diversos aceitos pelo, no caso, o Brasil, acostumado com a conformidade. Creio que por muito tempo irá soar aquela contundente afirmação do pontífice no Riocentro: “Sejam revolucionários e acreditem no casamento”; “lutem contra a corrente”; “tenham coragem de ser felizes”.

Não à toa, o papa Francisco consolida-se no Brasil como um representante de novos caminhos e alternativas sociais e de vida em construção, assim como dá o tom da nova projeção católica no mundo e das ações motivadoras das reformas. Como disse Jorge Bergoglio, a Igreja precisa mexer-se de tempos em tempos, independente de eventuais crises, o que necessariamente impacta o seio de outras esferas sociais. Por mais que muitos dos nossos cérebros disfarcem, como se não estivessem envolvidos e não compreendessem os anseios e as atmosferas em ebulição, precisam repensar o vigente contexto particular e social, brasileiramente intensificado com as inéditas, de certa forma, surpreendentes e espontâneas manifestações populares realizadas em junho. 

Claro, as mudanças requerem tempo para serem efetivadas, mas o tempo de mudanças, por sua vez, quer ações efetivas. E elas parecem já estar gradativamente em curso! 

Bruno Lara 
Jornalista e mestre em Ciência da Informação.

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