Heureca! Um novo método sociofutebolístico

Foto: Agência Reuters
Já se foi a Copa. Sentimos uma mistura de euforia, ressaca e nocaute. Agora, resta-nos, e será inevitável, a reflexão do que foi tudo isso. Tanto futebolisticamente, quanto cultural e politicamente. Sem dúvida, esse grande evento, com as suas desvantagens e benefícios, é um marco na história do Brasil e no desdobramento da nossa constante formação cidadã. O tempo nos amadurecerá e nos permitirá uma clareza e uma consciência mais equilibradas do que foi essa festa e será as suas consequências - festa, na livre interpretação do conceito.

Primeiro, permita-me fazer um breve e humilde comentário sobre aspectos específicos futebolísticos. O Felipão! Ó, o Felipão! Talvez ele tenha sido vítima da vontade humana de querer mais e mais e mais. Ele já havia sido campeão em 2002, consagrado, experiente, respeitado por todos nós. Não precisava provar mais nada. Sempre seria o Felipão. Mas... foi grande a vontade de ser o segundo técnico da História a ter duas Copas do Mundo no currículo, feito só realizado pelo italiano Vittorio Pozzo, em 1934 e 1938. Ah, a História! Como o desejo de ficar para a História (!), de ser lembrado daqui a 150, 200 ou mil anos nos seduz, mesmo que já estejamos a muitos e muitos quilômetros da Terra, sabe-se lá onde!

Não deu. Pior ainda, a forma como foi, rebaixando o futebol brasileiro, na minha opinião, à terceira categoria. Tudo bem, mas também precisamos reconhecer que a vida é tão bondosa que nos dá ângulos de observação. E um desses pontos de vista mostra um Felipão corajoso, ousado, capaz de fazer o que poucos fariam, assumindo uma responsabilidade absurda, uma pressão enorme. No fim de tudo, ainda declarou ser ele o culpado. E sabemos que é um exagero haver um único réu e condenado. Ele deu uma lição de líder e honradez. E a Dona Lúcia soube reconhecer isso! Saibamos, também! 

No calor do momento, dá vontade de demitir sumariamente o Felipão, mandar ele para Marte, desconsiderar o penta de 2002 e afirmar que o título havia sido fruto da sorte. Injustiça! Isso é estimular a cultura do ódio, da intolerância, da raiva. As consequências dos atos dele, corretos e errados, serão sentidas, independente do grau de fervor da crônica jornalística e esportiva. 

Quem na Seleção gostaria de perder, e daquela forma? Ninguém. Talvez se a Copa fosse na Argentina, teria sido muito mais leve para o time, e agora estaríamos gritando nas ruas de Buenos Aires, onde deixaríamos o segundo par das Havaianas. Mas, a responsabilidade de fazer bonito em casa é muito maior. Talvez não tivéssemos a noção do quanto, pois estávamos envolvidos em nuvens de euforia e críticas ao mesmo tempo: “fora FIFA”; “Brasil, o país do futebol”; etc.

Embora muitos de nós fôssemos contra o megaevento, ele foi e será positivo, na minha opinião, inclusive para entendermos melhor o que significa e em que grau está a nossa democracia, para conhecermos e nos aprofundarmos mais nas formas de participação popular, aprendermos um pouco mais o que é a cidadania (sempre lembro o exemplo dos japoneses retirando o lixo das arquibancadas da Arena Pernambuco), enfim, uma série de aspectos ainda a serem desenvolvidos e conscientizados por nós. 

Ouso dizer e antecipar as análises históricas que a Copa foi um dos períodos culturais e sociais mais ricos do país. Ok, sofremos com corrupção, politicagem, baixa qualidade dos serviços públicos (e não nos esqueçamos de muitos serviços privados, também), mas sem a Copa o cenário seria outro?

Possivelmente, estamos ingressando em uma nova etapa da nossa brasilidade. E eu penso que essa fase precisa reforçar a autorreflexão. Sejamos críticos e exigentes com o setor público, claro (!), mas também sejamos fiscais de nós mesmos, buscando aperfeiçoar os nossos comportamentos. Concomitantemente, é importante tentar salvar o Brasilzão, assim como aperfeiçoar os ambientes mais próximos, o escolar, o familiar, o do trabalho...

Ser contundente apenas com as instâncias representativas (atitude plausível), seria como se os jogadores da Seleção acusassem o Felipão, mas se abstivessem das suas parcelas no desempenho da equipe. E isso parece que não houve! Mudemos o método: um novo Brasil a partir de nós mesmos!

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